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terça-feira, 2 de novembro de 2010

O Legado para as Novas Gerações (P.S.: não precisa embalar para viagem, não!)

(Texto autoral: Silmara Taú da Silva)


Cena cotidiana: fazendo compras, as várias opções consumíveis, a dúvida nas escolhas, enfim: a decisão de ter separado tudo o que precisava. Hora de ir ao caixa, passar o cartão, quando, na hora de fechar a conta, a atendente encaminhou-se para embalar em sacolas plásticas. Diante a consciência aflorada pelo bom-senso, agradeci dizendo:

- Pode deixar, não precisa de sacolinha!

A funcionária olhou curiosa - até parecia desapontada, sob um determinado ponto-de-vista -, e completou:

- Difícil gente como a senhora! Quase todos fazem questão da sacolinha! E tem aqueles que ainda pegam uma pilha de sacolas, dobram e guardam descaradamente, dizendo que vão levar “pra pôr lixo”...

Fiquei por alguns flashes de pensamento divagando: irresponsabilidade dupla! A sacola plástica fazendo dupla infalível com os detritos, vagando por aí nos lixões, nos aterros sanitários, e não muito dificilmente boiando num córrego, rio ou manancial, ou até mesmo fazendo presença num terreno baldio atrás de muitas residências como a sua ou a minha. Até quando?!

Nesse ínterim, tirei minha sacolinha de pano de dentro da mochila – dobradinha, ali, esperando pelas compras, não faz volume nenhum. Faz leveza, até. Para um mundo melhor. “A leveza da consciência que tem de ser contagiosa”, pensava eu, ao mesmo tempo em que conversava com a operadora de caixa do mercado. Num desabafo, falei em tom compreensível – até didático - sobre o que representa o abusivo consumo de sacolas plásticas e do plástico em geral. Ela disse ter tido uma manhã inteira de treinamento com o administrativo da loja, e que já sabia dos malefícios que sobrevêm acerca das ditas sacolinhas: animais intoxicados, solo adulterado, entupimento de bueiros e galerias de saneamento, só para citar alguns. Com o semblante entristecido, sentenciou:

- Não sei como proceder e contribuir na causa, pois o cliente exige o acondicionamento da mercadoria nas sacolinhas plásticas. Rejeitam saquinho de papel, e torcem o nariz quando nossos auxiliares oferecem uma caixa de papelão. Um senhor raivoso disse até que não têm lugar pra caixa na casa dele, e que se eu quisesse podia mandar a caixa passear num local não muito gentil!

Este é o dilema: a ponta da operação. Deixar para o cliente decidir quando não há opções, é dar um tiro no pé, como candidata a Empresa Responsável: a atendente de caixa pouco pode argumentar, quiçá obrigar o cliente a sair sobraçando os itens na mão, sem acondicionar os mesmos em um instrumento para transporta-los devidamente – eis que o único vilão vira herói: a sacolinha – e só ela – resolve a questão!


Sabemos que o consumidor procura sempre por escolhas que ofereçam maior valor agregado – e a sacola faz tal viés no sentido de transportar a compra, ao mesmo tempo que pode ser útil para acondicionamentos domésticos diversos – inclusive para o lixo, nosso “crime duplo” – porém já passa de valor agregado para, digamos, “aglutinado” ao fenômeno da compra, pois não é mais percebido por si só, a menos que seja subtraído, como tem sido o conceito de abandono de uso das sacolinhas por uma atitude de responsabilidade sócio-ambiental. Aí o bicho pega. É aí que, a meu ver, as corporações que oferecem produtos de consumo entram em cena no papel de coadjuvante na transição destes valores pessoais. E podem marcar um gol de placa nesse jogo, sem acenar para a questão de mero marketing institucional mascarado de responsável.

As empresas precisam tomar decisões que ofereçam escolhas conscientes ao cliente: a exemplo do que ocorre em algumas redes americanas de supermercados, estas incentivam a aquisição de sacolas de pano recicláveis com a logomarca da empresa – em muitas vezes a oferecem para clientes cadastrados, e ali aplicam um sistema de incentivos por pontuação pelo retorno do cliente utilizando a sacola, que o faz obter descontos progressivos em suas compras. O resultado é um enxugamento com o custo de embalagens, repassados em parte para a fidelização e conscientização do cliente – o ambiente agradece, e todos fazem sua parte.

O certo é que para pessoa física como eu, bem como para o mercadinho ou a grande rede de lojas fazermos nosso papel consciente na sociedade, nem deveríamos esperar por leis e sanções para fazer a diferença. Quantas mudanças aconteceriam se cada cidadão agisse um pouquinho a cada dia em prol da sustentabilidade? Contra o desperdício? A favor da conscientização?

Costumo dizer que o grande legado que deixamos para o mundo, nesses tempos de consumo absoluto, não está em grandes obras artísticas, fatos heróicos de repercussão quilométrica ou prêmios Nobel - pense na diferença de ser um a menos a não destruir.

(postado por Silmara Taú da Silva - 02/11/2010 - 21h22min)